Zona de Intervenção
Vale de Alcântara (Lisboa)
A Casa das Artes tem quatro quartos...
Quarto das perguntas
Quarto do irreal (ou da poesia)
Quarto da invenção (ou da memória inventada)
Quarto do barulho (ou do silêncio)
Os sentimentos de exclusão social atravessam de forma persistente a comunidade do Vale de Alcântara. O desemprego, os baixos níveis de escolaridade, a violência, a marginalidade e a escassez de oportunidades continuam a marcar o quotidiano de muitos residentes. A degradação dos espaços públicos e a fragilidade das redes de vizinhança aprofundam esta sensação de afastamento, levando muitos a sentirem-se desligados da cidade e dos seus ritmos, como se habitassem uma ilha cercada por muros invisíveis. Ainda assim, existe um claro potencial de transformação sempre que o território se abre a novas experiências, práticas e parceiros comprometidos com a inclusão social e o desenvolvimento comunitário, capazes de criar oportunidades, devolver horizontes e contribuir para um renovado sentido de pertença.
Permanece igualmente uma memória forte de coesão social, associada ao antigo Casal Ventoso, onde a partilha, a proximidade e o convívio estruturavam a vida comunitária. Passados mais de vinte e cinco anos sobre o processo de realojamento, esse passado continua presente como um luto colectivo por um lugar perdido. Ao longo do tempo, o espírito comunitário foi-se diluindo, deixando marcas profundas na forma como o território se reconhece e se relaciona consigo próprio.
Neste contexto, a arte surge como um dispositivo de transformação individual e colectiva. A criação artística tem a capacidade de intervir sobre comportamentos negativos, reforçar a auto-estima e provocar mudanças significativas, ao abrir espaços de expressão, escuta e reflexão. Ao estimular o pensamento crítico e a expressão criativa, os projectos artísticos colaborativos contribuem para a reconstrução de vínculos, para a inclusão social e para o diálogo intergeracional, devolvendo voz e visibilidade às experiências de vida da comunidade.
Em contextos socialmente desfavorecidos, a articulação entre arte, cultura e ecologia humana revela um forte potencial transformador. Estas práticas permitem fortalecer identidades positivas, regenerar o tecido social e criar novas ligações entre as pessoas, o território e a memória. Ao promoverem a reflexão crítica e a partilha de experiências, abrem igualmente novos horizontes culturais, emocionais e cívicos, fundamentais para um desenvolvimento sustentável e inclusivo.
A Casa das Artes [Vale], através de um consórcio de entidades promotoras e parceiras, em estreita colaboração com a GEBALIS enquanto parceiro de proximidade e articulação, desenvolve um trabalho continuado com a comunidade, estruturado em quatro áreas fundamentais: Palavra, Som, Imagem e Ecologia Humana. Estas áreas cruzam práticas de criação artística, memória pessoal e colectiva, reflexão sobre cidadania e problemáticas sociais contemporâneas, valorizando o património humano como motor de criação, diálogo e auto-estima.
O projecto estabelece ainda pontes com outras iniciativas activas nos territórios BIP/ZIP 3, como Envelhecer Vivendo e Fazer a Ponte/Escolhas, bem como com equipamentos e programas culturais do Município, nomeadamente as Bibliotecas e o programa *Um teatro em cada bairro*. Estas articulações reforçam sinergias, ampliam a visibilidade do trabalho desenvolvido e contribuem para uma maior ligação entre o Vale de Alcântara e a cidade. A avaliação do impacto assume um papel estratégico, permitindo acompanhar as transformações geradas, compreender as dinâmicas em curso e ajustar o projecto às necessidades reais da comunidade.
O projecto
Casa das Artes — Arte e Cidadania
A fala e a ecologia humana
Uma casa com quartos infinitos
A intervenção
Vale de Alcântara:
2025/26
2024/25
2023/24
Liberdade:
2025/26
Conceito original
Filipe Faria
Coordenação
Rita Santos
Filipe Faria
Um projecto
O Homem - Colectivo
\Associação para a Ecologia Humana
Financiamento
Câmara Municipal de Lisboa
Programa BIP/ZIP
Parceria
Projecto Alkantara
\Associação de Luta Contra a Exclusão Social
Junta de Freguesia de Alcântara
Junta de Freguesia de Campo de Ourique
APORDOC ‑ Associação pelo Documentário
— Doclisboa - Festival internacional de Cinema
Comissão de Moradores do Bairro do Cabrinha
Comissão de Moradores do Bairro do Loureiro
Apoios locais
GEBALIS - Gestão do Arrendamento da Habitação Municipal de Lisboa
Quarto das perguntas
A Casa das Artes [Vale] tem quatro quartos… O Quarto das Perguntas é uma proposta que visa criar um espaço comunitário dedicado à arte da imagem e ao seu potencial de problematização em torno das questões sociais relevantes em contextos desfavorecidos na cidade, em especial no Vale de Alcântara
Com foco em temas como ambiente, cidadania, exclusão social, criação artística, emprego, marginalidade, etc, propõe-se desenvolver um programa de exibição de um ciclo de 11 documentários (e 11 sessões de mediação), com curadoria APORDOC ‑ Associação pelo Documentário, abordando questões que afectam a vida das comunidades. Através do poder da narrativa visual, a comunidade é colocada perante as histórias pessoais e colectivas de outros. O objectivo é estimular a reflexão e o diálogo e incentivar a discussão em torno dessas questões complexas.
A programação conta, ainda, com mediadores especializados, realizadores, produtores, artistas e membros da comunidade no desenvolvimento de debates após a exibição dos documentários que motivarão a discussão e a problematização, oferecendo perspectivas complementares.
Pela arte e cultura, procuramos abrir novos caminhos e abordar desafios sociais, estimular a criatividade e a transformação positiva nas comunidades desfavorecidas das grandes cidades
Este Quarto afirma-se como um farol de esperança e empoderamento, mostrando que a arte pode inspirar mudanças significativas rumo a um futuro mais inclusivo e consciente.
Quarto do irreal (ou da poesia)
O segundo quarto da Casa das Artes – Quarto do irreal (ou da poesia —, promove o Penso Rápido — Criação e Cidadania, um projecto de construção colectiva mediado por Solange F., que utiliza a criação artística para estimular o pensamento crítico e a expressão criativa dos jovens. A arte torna-se uma ferramenta de emancipação, incentivando a produção de uma obra colectiva que desafia a percepção do mundo e promove narrativas próprias. Utilizando tecnologias acessíveis como a câmara de telemóvel, os participantes exploram e reimaginam a realidade que os rodeia, desenvolvendo competências criativas, técnicas e críticas essenciais para a autonomia e a participação activa na sociedade.
O projecto estrutura-se a partir da exploração inventiva de textos de dramaturgos portugueses como Gil Vicente (c.1465–c.1536), cuja escrita, marcada pela sátira social, observa e desmonta, com ironia e lucidez, as tensões sociais, políticas e morais do seu tempo (e tão actuais), oferecendo uma leitura crítica das injustiças e contradições da sociedade coeva. Esta abordagem é tão actual hoje como ontem e é convocada como matéria para a criação.
A partir de uma leitura crítica e imaginativa, os participantes identificam paralelismos com os desafios de hoje e desenvolvem respostas artísticas livres, cruzando tradição e contemporaneidade. A prática artística torna-se um gesto de análise e invenção, um espaço para repensar o mundo e afirmar novas possibilidades de cidadania e transformação.
Quarto da invenção (ou da memória inventada)
A sociedade contemporânea reserva pouco espaço — formal, conceptual e emocional — ao lugar da fala na velhice. Trata-se de um território frequentemente marginalizado, feito de vozes silenciadas e de experiências ignoradas. No entanto, aquilo que os mais velhos têm para dizer importa e deve ser escutado. Reconhecer o seu direito a participar nas decisões da comunidade, a expressar opiniões e necessidades, é fundamental para uma sociedade mais justa. Ouvir todas as vozes, partilhar memórias e projectar o futuro a partir delas promove a inclusão social, reforça o diálogo intergeracional e valoriza a diversidade de percursos.
A memória e o passado desempenham um papel central neste lugar da fala, ajudando a desenhar caminhos futuros. Longe de ser um arquivo fixo, a memória é um processo vivo, condicionado pelo tempo, pelos contextos e pelas experiências, transformando-se continuamente. Entre verdade e ficção, a memória constrói narrativas que moldam identidades e abrem novas possibilidades de sentido.
Depois dos volumes 1 e 2, o Lugar da Fala, volume 3, dedica-se à criação de memórias inventadas: histórias de vida novas, surreais, divertidas ou trágicas, contadas como se fossem naturais e verdadeiras. Através da prática artística, estas narrativas abrem espaço a diálogos intergeracionais profundos e a leituras cruzadas de tempos, sons e imagens imaginados.
Quarto do barulho (ou do silêncio)
A Casa das Artes [Vale] tem quatro quartos… O Quarto do barulho (ou do silêncio) é uma proposta que parte da expressão musical através da percussão corporal e de mesa. O projecto cria uma plataforma para a expressão artística e o desenvolvimento pessoal através da exploração rítmica. Utilizando o corpo e objectos do quotidiano (copos, mesas, talheres…) como instrumentos, os participantes são incentivados a criar e experimentar sons, desenvolvendo habilidades musicais e de coordenação motora.
Através de sessões dinâmicas, conduzidos por mediadores especializados, os participantes aprendem técnicas de percussão e criação, promovendo a criatividade e o trabalho em equipa. Estas sessões não promovem, apenas, uma forma de expressão artística, mas funcionam, também, como um meio de inclusão social e empoderamento, permitindo que um grupo de crianças e jovens descubram novos talentos e reforcem a sua autoestima.
O Quarto do Som procura fomentar o sentimento de comunidade e a colaboração, ao envolver os participantes em apresentações públicas e eventos comunitários. Estas actividades ajudam a criar laços sociais mais fortes e a sensibilizar a comunidade para as potencialidades transformadoras da música. O projecto procura, desta forma, transformar vidas, som a som, ritmo a ritmo, através do poder unificador e expressivo da música, contribuindo para um ambiente comunitário mais inclusivo e vibrante.